Eu amo-Vos Jesus pela multidão que se abriga dentro de vós, que ouço, com todos os outros seres, falar, rezar, chorar, quando me junto a Vós.
TEILHARD DE CHARDIN

segunda-feira, 26 de março de 2018

Olhar a cruz com os olhos do centurião...

Olhar a cruz com os olhos do centurião.
padre Ermes Ronchi
Domingo de Ramos (Ano B) (25/03/2018)
Evangelho: Mc 14,1-15,47
Jesus entra em Jerusalém, não apenas um evento histórico, mas uma parábola em acção. Mais: uma armadilha de amor para que a cidade o receba, para que eu o receba. Deus corteja a sua cidade de várias maneiras. Vem como um rei necessitado, tão pobre que nem sequer possui o mais pobre animal de carga. Um Deus humilde que não se impõe, não esmaga, não faz medo. “Nunca nos acostumamos a um Deus humilde" (Papa Francisco).
O Senhor precisa dele, mas vai devolvê-lo logo depois. Precisa daquele burrito, precisa de mim, mas não ficará com a minha vida; liberta-a, e faz com que seja o melhor que se possa tornar. Abrirá espaços em mim para o voo , para o sonho.
E então dizem: Bem-aventurado aquele que vem em nome do Senhor. É extraordinário poder dizer: Deus vem. Neste país, nestas ruas, em toda casa que tem gosto de pão e de abraços, Deus vem, eternamente a caminhar, viajante dos milénios e dos corações. E não está longe.
A Semana Santa desdobra, um por um, os dias do nosso destino; vêm ao nosso encontro lentamente, cada um deles generoso em sinais, símbolos e luz. A melhor coisa a fazer para a viver bem é estar perto da profundíssima santidade das lágrimas, perto das intermináveis cruzes do mundo onde Cristo é ainda crucificado nos seus irmãos. Estar próximo, com um gesto de cuidado, uma batalha pela justiça, uma esperança silenciosa e teimosa como o bater do coração, uma lágrima recolhida de um rosto.
Jesus entra na morte porque a ela é submetido todo o filho da terra. Ele sobe na cruz para estar comigo e como eu, para que eu possa estar com ele e como ele. Estar na cruz é o que Deus, em seu amor, deve ao homem, que está na cruz. Porque o amor conhece muitos deveres, mas o primeiro é estar com o amado, agarrar-se a ele, segurá-lo em si mesmo e depois arrastá-lo para o alto, para fora da morte.
Apenas a cruz remove qualquer dúvida. Qualquer outro gesto nos teria encerrado numa falsa idéia de Deus: a cruz é o abismo em que um amor eterno penetra no tempo como uma gota de fogo e resplandece. Quem entendeu primeiro foi um pagão, um experiente centurião perito em mortes: aquele ali crucificado era o filho de Deus, o que o conquistou? Não foram milagres, nem ressurreições, apenas um homem pendurado nu ao vento.
Ele viu dar uma volta ao mundo, em que a vitória sempre foi dos mais fortes, mais armados, dos mais implacáveis. Viu o supremo poder de Deus que é dar vida até mesmo àqueles que dão a morte; o poder de servir não de servir-se; de vencer a violência, tomando-a sobre si.
Viu, na colina, que este mundo traz outro mundo no útero. E é o crucifixo que possui a chave.
Imagem de J.Tissot

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